Catarina Montenegro
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Sobre escrever


A escrita sempre foi, para mim, como uma melhor amiga: sempre disponível para me ouvir, para analisar comigo os vários pontos e perspetivas de cada situação. Sempre soube silenciar-se quando o momento assim exigia. A escrita foi sempre um lugar de extrema segurança — pela ausência de julgamento, pelas folhas em branco que me permitiam ser totalmente autêntica, sem olhos castradores a vigiar-me.

A escrita: esse lugar de partilha interna, de crescimento, de análise, de autenticidade, de muita vulnerabilidade.

Nunca me importei se escrevia bem ou mal nos meus cadernos, se dava erros (que sempre dei muitos — e ainda dou, por causa da minha dislexia autodiagnosticada), se as frases tinham pontuação, ou se eram compreensíveis. Também nunca reli muito do que escrevia, porque até de mim sentia vergonha. Nas poucas vezes em que o fiz, encontrei erros ortográficos de bradar aos céus, frases que exigiam de mim mil leituras até conseguir compreender-me.

Ou seja: escrevi a vida toda — considerarei 35 anos de escrita regular — e, ainda assim, nunca vi a escrita como algo que pudesse transformar-se em “alguma coisa minha”. Porque escrever era um segredo, uma intimidade, uma parte demasiado pessoal, demasiado minha, para algum dia ser partilhada.

Sem falar que sou das artes, não sou das letras. O meu cérebro adora desmistificar problemas, trabalhar com números, mecanismos, descobrir novas formas. Gosto de comunicar com sensação, com estética, com beleza e questionamento.

Sempre pensei que quem escrevia livros tinha de ser expert em literatura, gramática, linguística, falar no mínimo cinco idiomas, ser professor universitário numa faculdade de letras, enfim...

Entretanto, comecei a ler — em vários sítios e livros — que, para se escrever, era preciso ler muito. Eu leio muito. Sempre li muito.

Que era preciso escrever muito, sem importar o quê. Eu sempre escrevi muito.

Ora bolas, queres ver que, afinal, eu tinha de repensar todas as minhas ideias sobre escrever?

Foi quando abri espaço para pensar no assunto. E a grande conclusão a que cheguei é que um escritor — daqueles mesmo bons, dos que eu tenho no meu top 1 — é, na verdade, um artista: alguém extremamente criativo, que tem ideias diferentes e as sabe contar numa história uouuuu.

No top 2, é alguém que escreve sobre algo que domina muito — seja uma história de vida diferente, seja um profissional experiente numa área qualquer, que tem muito para ensinar.

Ou seja, não tem, afinal, de ser um profissional de literatura. Pode até ser preciso recorrer a um para auxiliar no processo ou corrigir o que for necessário no final da escrita, mas um escritor não tem de ser nada — porque pode ser qualquer coisa. Desde que saiba que pode fazer a diferença, trazer algo de novo, ser humilde para partilhar a partir de um lugar de conhecimento e entrega, e, principalmente, queira fazê-lo e usufrua do processo.

Eu comecei a quebrar as minhas crenças limitadoras sobre a escrita a partir do momento em que senti vontade de escrever um livro sobre iluminação. Senti que o queria fazer, mas sentia-me mal por isso — como se me estivesse a armar em boa, ou algo assim. Este caminho já vai longo. Já desconstruí muitas ideias para caminhar no sentido de o concretizar. Ou seja: eu prometo que vou escrever este livro. Hoje, publico esta promessa. Mas já não me culpo por ainda não o ter feito, nem penso que não sou suficiente, ou que sou arrogante, ou que estou a procrastinar.

Eu estou apenas a preparar-me. No fundo, o processo já começou lá atrás, quando comecei a aprender sobre palavras.

Para concluir: tudo é arte, e todos podemos ser artistas — se conseguirmos desbloquear os pensamentos e as crenças toscas que nos limitam.

Se me leste até aqui, é hora de te dizer:
Olá, artista. :)

©CatarinaMontenegro, 2024